ANDERLE NEUROCIRURGIA, NEUROLOGIA E CIRURGIA DE COLUNA

Filosofia em relação às cirurgias

Esta parte do manuscrito é dedicada aos pacientes que pretendem transcender ao entendimento técnico da realização de uma cirurgia de grande complexidade. Porém, nos vídeos e textos, ao longo do site, existem explicações sobre algumas das técnicas cirúrgicas (existem detalhes técnicos que podem ser melhor explicados na dependência de cada caso).

As primeiras etapas do entendimento são técnicas e impessoais. Passarei minha visão e forma de vivenciar cada situação. Novamente oriento que não há nada de místico ou vinculado a algum dogma religioso no que irei descrever adiante. Trata-se de uma maneira de viver e, a vida é plenitude. Assim, nosso caminho, neste caso o profissional, engloba totalmente minha vida. Não analiso as situações de forma isolada ou seja, eu médico e você paciente. Na verdade há um bom tempo não faço análises e sim sínteses. Ou seja, acho que somos interligados de alguma maneira e que o que faço a ti, faria a mim. 

Desta forma quando digo que, infelizmente, em determinado caso, não há nada à ser feito em minha opinião (respeito todas opiniões), além de oferecer amor, conforto e muitas vezes medicamentos ou medidas não invasivas, é porque agiria desta maneira comigo. No entanto não tiro as esperanças de qualquer ser vivo. Ademais, quando dou alta médica ou encaminho para algum outro profissional é pelo simples fato de achar que tal atitude é a melhor, naquele momento para o paciente. Respeito a ansiedade do enfermo e da família do mesmo em resolver a situação, porém tenho meus limites morais e éticos. As expectativas, crenças e projeções fazem parte de nossa existência, portanto, as respeito.

Como escrevi previamente, esta parte do texto reserva-se para pessoas que possuem no momento, interesse em saber como vivencio minha vida profissional, dando ênfase às cirurgias.

Em analogia ao texto de Eugen Herrigel, o pocessso de aprendizado cirúrgico, neste caso, nas cirurgias complexas de coluna, é transposto à prática de aprendizado do arqueiro Zen. Isso só acontece quando arco, flecha, arqueiro e alvo não são mais do que um. De forma inconsútil, o neurocirurgião une-se em essência ao seu paciente, aos seus tecidos muscular, ósseo e neurais e, com o auxílio do instrumental cirúrgico (os quais tornam-se extensões de nossas mãos), realizam o término da separação sujeito-objeto, tornando-se uno com o ser a ser operado. Assim, anos de prática incessante são subitamente manifestos, com mínimo esforço. 

Dois tipos de cirurgia que gostaria de considerar de forma mais detalhada

Tratamos aqui, na maioria dos casos de uma jovem. Uma moça, em desenvolvimento que por questões ainda não descobertas totalmente pela ciência, desenvolve uma curvatura do tronco. Tal deformidade pode ser leve ou acentuada. A indicação da cirurgia já foi exposta nos itens pertinentes no site.

Quando nos postamos diante de tal situação, a empatia é de extrema importância, pois tal jovem visa como qualquer indivíduo, uma característica estética compatível com seus pares. Ao meu ver, todos são lindos perante a criação, porém, esta mesma criação proporcionou ao ser humano conhecimento acumulado para ajudar que o corpo humano entre em um equilíbrio mais adequado para as demandas sociais.

Assim, quando indicado a cirurgia de escoliose, alguns argumentos meus (podem não ser compartilhados por outras pessoas), são levados em consideração por toda nossa equipe.

  • Reverência pelo corpo humano.
  • Realizar a cirurgia como se fosse em nossa filha.
  • Conhecimento PLENO do paciente, suas expectativas e medos. Conhecimento íntimo da anatomia e de TODAS técnicas cirúrgicas.
  • Silêncio interior. Isto traz clareza a mente. Você nunca pode realizar um procedimento desta importância sem a límpida e perfeita beleza da calma e da segurança. Sua atenção (quando eu menciono atenção, transcendo o conceito de concentração), deve estar voltada para a cirurgia, desde o momento que a conduta cirúrgica é tomada.
  • Oferecer SEMPRE o melhor que você é capaz.
  • Comprometimento total da equipe para oferecer o melhor resultado possível.
  • Usar a técnica mais apropriada para o caso. Quando citei o texto obtido da Arte Cavalhereisca do Arqueiro Zen, tento-me fazer entender da seguinte forma. Em todas as etapas da cirurgia, devemos sentir de forma contínua a pessoa operada, desde a dissecção do tecido muscular, passagem dos parafusos pediculares, osteotomias (ressecção do osso) e manobras para o realinhamento da coluna.
  • Entender o limite do corpo humano. A escoliose severa com rigidez óssea, está sendo operada de forma tardia e, assim, devemos respeitar tal santuário. Eventualmente a correção parcial é o adequado para o paciente.

Estes casos não são estéticos. São submetidos à cirurgia pacientes com dores incontroláveis, déficits progressivos ou deformidades claramente progressivas.

As cirurgias da transição crânio cervical, os quais envolvem infecções, mal formações congênitas, traumas e tumores são extremamente complexas. Seguem os mesmos preceitos cirúrgicos que descrevi na escoliose. No entanto, algumas considerações são importantes:

  • Nossa equipe realiza tais procedimentos após longas discussões e simulações sobre o posicionamento do paciente, a técnica à ser utilizada e redução à ser obtida.
  • A anatomia da região e suas ÍNUMERAS variações anatômicas, principalmente da artéria vertebral estão incrustadas em nosso ser, a despeito do uso de neuronavegação intra-operatória e monitorização eletro-fisiológica. O entendimento perfeito da anatomia desta singular região e de suas variações são a pedra fundamental de um resultado adequado para tais situações.
  • A clareza da mente, sem sombra de dúvidas, é essencial para realizar estes procedimentos. Uma mente conturbada não consegue oferecer ao corpo as habilidades necessárias para exercer de forma apropriada este tipo de cirurgia.