Doenças e Sintomas

Doença da Transição Cranio Cervical

Doenças que envolvem a transição da cabeça com o pescoço: o termo descrito não é técnico, porém, é para quem não é da área entenda. O termo correto é Síndromes ou Patologias da transição crânio-cervical.

Temos várias, dentre elas as congênitas, com progressão e piora, as quais são as mais comuns. Mas podemos ter tumores primários, metástases, infecções e traumas. Como irei reiterar adiante, em uma parte do texto que transcende os conceitos tradicionais, para lidar com estas doenças, deve-se ter MUITA EXPERIÊNCIA. São patologias (doenças), extremamente complexas nas quais, várias variações da anatomia tradicional encontram-se presentes. Além disto, a deformidade progressiva causa alterações ósseas significativas, fazendo com que a tomada de decisão nestes casos seja meticulosamente planejada. Junto com a escoliose, tais doenças sempre me atraíram, fazendo com que estudasse até a exaustão tais enfermidades. De fato, tenho um prazer enorme em poder auxiliar estes pacientes. Existem inúmeros profissionais no Brasil, os quais possuem muita experiência para a realização destes procedimentos.

Vamos, antes de citar algumas características técnicas, vamos citar algumas curiosidades. Alguns pacientes, vítimas de traumas de alto impacto (acidentes automobilísticos), podem sofrer um tipo de fratura da segunda vértebra cervical que denomina-se FRATURA DO ENFORCADO ou HANGMAN. Tal enfermidade não é exatamente como era exatamente descrita, pois na época, não existiam os meios diagnósticos adequados e portanto, era limitada (em descrições) às lesões de pacientes enforcados judicialmente. 

Vamos entrar um pouco na história, para que o texto não fique maçante. Até aproximadamente a metade dos anos 1800, a pena capital por enforcamento era realizada por ESTRANGULAMENTO, ou seja, que o “criminoso” fosse enforcado pelo pescoço até a morte. Isto com certeza não era algo muito rápido, e gerava, acredito eu, sofrimento prolongado. Com o peso do indivíduo, a corda apertava progressivamente a região cervical até, separar de forma grotesca os elementos cervicais das estruturas do crânio. O nó da corda era posicionado entre a mandíbula e a orelha. Haughton, foi o primeiro a descrever o óbito pelo deslocamento agudo causado pela fratura em C2 com lesão fulminante na transição entre bulbo espinal e medula. Assim, de forma extremamente resumida, em 1886, o nó da corda era posicionado abaixo do queixo. Assim, existiria uma extensão cervical associada à tração vigorosa da transição crânio-cervical, gerando uma morte rápida. Marshall esteve de acordo com esta execução mais humana. No entanto, gerou certa oposição do então presidente da Brishit Medical Association, James Barr. Este último acreditava que a energia dispendida na queda do corpo era a responsável pela morte, sendo até elaborado uma complexa fórmula na qual o criminoso, caso possuísse a massa de de 140 pounds (63 kg e 540 g) uma queda de 9 pés (2,743200 m), geraria uma força de 1260 Foot Pound – torque. Bom, apesar da física aplicada, o nó continuava sendo utilizado lateralmente, fazendo com que o condenado sofresse com a separação das estruturas crânio-cervicais.

Enfim, após outros estudos de cadávers executados por ambas técnicas, o posicionamento submentoniano (abaixo do queixo), foi o escolhido, pois a execução era imediata.

Este tipo de fratura, em sua maioria, é de tratamento conservador, com órtese rígida e, eventualmente cirúrgico. A abordagem cirúrgica, quando necessária, pode ser tanto por via anterior quanto por via posterior.

Fraturas do processo odontóide da segunda vértebra cervical : fratura comum. E muito frequente em idosos. O tipo 2 é o tipo mais associado à cirurgia. A depender do direcionamento do traço de fratura, porte físico do paciente e, integridade ou não do ligamento transverso do atlas, a cirurgia pode ser realizada por via anterior ou posterior.

Lesões do odontóide (pannus) , subluxações C1C2 e cranial settling : comuns em pacientes com artrite reumatoide. A mortalidade é extremamente alta caso não realize-se a cirurgia.

Invaginação basilar: congênita e progressiva em alguns casos. Pode estar associado à má-formação de Arnold-Chiari tipo 1. Em todos os casos que descrevi acima, destaco que é necessário uma união entre conhecimento teórico e muita prática. Mas, em invaginações basilares, nas quais, a coluna cervical insinua-se para o interior do crânio, o conhecimento deve ser PLENO. Quando escrevo PLENO quero me fazer entender da seguinte forma: não basta ter noção da anatomia da região e dominar uma ou duas técnicas de correção cirúrgica. 

A distorção anatômica causada pela progressão da doença já bastaria para causar dificuldades no planejamento cirúrgico e, principalmente, no intraoperatório. Porém a situação torna-se muito mais severa pois, tais patologias são acompanhadas de inúmeras variações anatômicas (principalmente da artéria vertebral) e, ocorrem muitas vezes em pacientes idosos e debilitados pelo déficit motor causado pela compressão bulbo-medular.

Deve-se conhecer todas as opções técnicas para tais procedimentos, a versatilidade nestas situações é de suma importância para um adequado desfecho cirúrgico. 

Nos utilizamos de algumas opções técnica. São elas: utilização de C1 em praticamente todas as artrodeses, uso de mais de uma técnica de passagem de parafusos em C2 para evitar falência do implante, uso de parafuso condilar e uso de CAGES entre C1 e C2.

Mas independente de todas essas características e cuidados, trata-se doença grave com risco cirúrgico alto, porém quando existe indicação cirúrgica e o paciente possuir condições clínicas para tal, devem ser operadas, pois o benefício supera o risco.